domingo, 21 de fevereiro de 2010

A metamorfose

"Quando Gregor Samsa despertou uma manhã na sua cama de sonhos inquietos, viu-se metamorfoseado num monstruoso insecto".
Franz Kafka (1915)

Esta é a história de um homem que acorda transformado numa espécie de barata gigante e tem sua vida modificada pela total falta de controle em que se encontra. Trancado em sua própria casa, acuado pelos familiares e vitima de si mesmo, da visão errada que tinha do mundo que vivia antes da mudança, percebe que foi apenas ele que mudou, o mundo sempre foi assim.

Esta obra identifica a mudança de um homem diante da sociedade. Franz Kafka conseguiu retratar que as mudanças de compreensão do mundo resulta numa realidade não percebida antes, mas que estava sempre ali. E quando isso acontece, é inevitável querer gritar e modificar tudo que está em volta.

O período de latência pelo que passa o ser humano nada mais é do que a fase de assimilação de informações. Nosso cérebro e sua natureza plástica nos proporcionam o aprendizado, com nossas experiências absorvemos dados e conseguimos modelar algumas situações através do processo de generalização e isso leva muito tempo, há aqueles que nunca chegam a esse caminho. Em suma, somos colecionadores de fatos, processamos informações e quando estamos maduros o suficiente encontramos algo que nossas experiências determinaram. Com um certo arsenal estabelecido, estamos prontos para algo...

Paradigmas são quebrados, visões são conhecidas, temos uma certa noção do que sabemos pouco e do que sabemos nada. Eis a formação da personalidade. Sabemos quem somos, e o que queremos mas não há palavras para verbalizar, talvez a poesia seja o meio, eis porque tantos poetas e como são incríveis, compreendemos suas obras com a alma, não com a razão.

O que sentimos é algo interior, está no âmago de cada um, no id, e ficamos tão confiantes quanto ao que queremos que anulamos o superego e adeus censura, é tempo de arriscar.

A linguagem humana é muito pobre diante dos nossos pensamentos. Quando a metamorfose ocorre, não temos como listar os impactos que surgem em nossas visões, mas sabemos que algo mudou, que está bem ali, na ponta da língua, na memória recente, não há pudores em discordar...chega de meias verdades...é tempo de fazer algo que seja novo...colecionar informações sempre será necessário, o aprendizado é dinâmico, tudo se expande, mas chega de convencionalismos, não acreditemos em tudo, nem duvidemos...Qual o problema em ficar em cima do muro enquanto não tivermos certeza? Sejamos analíticos.

Quando o tempo chega é hora de ser ativo, de banir com conceitos pré concebidos e seguir com personalidade. Se errar, aprenderá , se acertar, aprenderá da mesma forma. Não há por que ter medo.

Quando ultrapassamos certa fase da vida em que uma nova concepção de mundo surge em sua frente, acredito que é devido o encontro de sua razão de ser, o reconhecimento de suas habilidades, suas paixões, seus anseios, os medos reais e a grande vontade.

A verdade é que mudamos, e como os insetos que crescem em degraus, de uma hora para outra, nossa maturidade deve ser assim, de repente, ao amanhecer, somos outros...

Compreendo agora, depois de ler o livro A metamorfose pela terceira vez. A primeira, quando ganhei o livro, em 1998...achei estranho, pra não dizer que não entendi nada. A segunda vez em 2000...nada. A terceira, final de 2009...eureca!

Eis nossos saltos...somos assim, cada qual com suas especificidades e gritos abafados. Cada qual com sua hora de gritar...as vezes sem ao menos saber o que gritar, e para qual direção, a vontade está ali...é isso que importa.

Bom grito à todos!
VCR

(Imagem: Quadro de Salvador Dali - A metamorfose de Narciso, Fonte: http://www.filosofia.com.pt)

5 comentários:

  1. "Todos os dias atravessamos a mesma rua ou o mesmo jardim, todas as tardes nossos olhos batem no mesmo muro avermelhado, feito de tijolos e de tempo urbano. De repente, num dia qualquer, a rua dá para um outro mundo, o jardim acaba de nascer, o muro fatigado se cobre de signos. Nunca os tínhamos visto e agora ficamos espantados por eles serem assim: tanto e tão esmagadoramente reais. Sua própria realidade compacta nos faz duvidar: são assim as coisas ou são de outro modo? Não, isto que estamos vendo pela primeira vez, já havíamos visto antes. Em algum lugar, no qual nunca estivemos, já estavam o muro, a rua, o jardim. E à surpresa segue-se a nostalgia. Parece que nos recordamos e queríamos voltar para lá, para esse lugar onde as coisas são sempre assim, banhadas por uma luz antiqüíssima e ao mesmo tempo acabada de nascer. Nós também somos de lá. Um sopro nos golpeia a fronte. Adivinhamos que somos de outro mundo..." (Octávio Paz)

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  2. Salve a metamorfose, Val!
    Grande beijo!

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  3. À escritora, os aplausos. Muito bom o texto. Metamorfose já!
    Abraço.

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  4. Maris, adorei ...(Octávio Paz). É este o rumo das coisas...das compreensões pelo menos. Beijão para você!

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  5. Dr. Jaedson, obrigada pelo estímulo sempre. Bjão

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